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sábado, 25 de abril de 2015

OUTRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESCREVER

Escultura de Auguste Rodin
Antes que alguém me pergunte ou faça qualquer observação sobre o tema: não, eu não gosto de escrever. Não que eu desgoste, deteste, despreze, não é isso, muito longe disso, aliás. Mas escrever é muito mais uma necessidade do que um desejo para mim. Ler, sim, é muito mais desejo que necessidade. Escrever me salva de mim mesmo e só se torna desejo quando a necessidade extrapola. O ato de pôr palavras e frases em ordem com (ou na desordem dos) meus pensa-sentimentos tenho certeza que têm me impedido de ficar louco ou morrer. Morrer mais no sentido de me anular, para ficar menos dramático, embora eu acredite piamente que signifique o mesmo. 

Ler é como alimento, mata a fome e satisfaz a vontade de comer, saborear, ter prazer. É como o amor, desejo e necessidade na mesma intensidade. Escrever raramente dá prazer, já até escreveram que dói, o que não foge muito da verdade, embora me pareça uma alusão meio exibicionista, pedinte de atenção. Muitas vezes o prazer vem depois da escrita, com uma leitura inteligente e sensível, principalmente quando surpreendente. No entanto, depende necessariamente de o leitor expor ao autor o que e como o leu.

Seja em prosa ou verso, tudo o que se escreve não pertence mais ao autor a partir de seu primeiro leitor. Daí, o eu não é mais de quem criou, se é que ele pensou mesmo em si na hora de escrever. Este ato que tanto pode ser nobre, quanto pobre, que carrega um status de ricaço decadente, é muitas vezes uma libertação, um grande alívio, um gozo solitário. O suor também é uma boa imagem para descrevê-lo, pois é mesmo aquilo que sai dos poros, dos poros da alma.

Embora seja um clichê, é verdadeiro dizer que a inspiração nada mais é do que nada, se não houver a transpiração. Uma boa idéia não surge do nada, ela está apenas esperando ser descoberta, captada, capturada por quem tem olhos livres o suficiente para enxergar o invisível bailando à sua frente, por quem tem mãos e dedos sutis e hábeis para agarrá-la com delicadeza. É como a escultura: ela já existe na pedra bruta, está apenas aguardando que o artista tire os excessos e a deixe transparecer.

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quinta-feira, 16 de abril de 2015

UM INESPERADO ENCONTRO NA MADRUGADA

Nas primeiras horas do último domingo, eu e um séquito de amigos e familiares saíamos de uma grande festa, quando nos deparamos com um grande e inesperado encontro. Distante ainda, eu o vi de costas, mas não tive qualquer dúvida, reconheci-o de pronto. Aproximei-me e solicitei a foto - sem selfie, porque senti que podia desagradá-lo com essas modernices. Meio a contra-gosto, ele aceitou fazer esta foto ao meu lado. Assustada com a nossa presença, a cabra vadia se esquivou, nada confessou e foi pastar em algum canto que não vi.

Na despedida, ia parabenizá-lo pela vitória do seu Fluminense sobre o Botafogo horas antes, quando o mestre ralhou seu descontentamento comigo: "Você não me lê mais, nem assiste mais a peças de minha autoria tem já uns dez anos". Fiquei um pouco encabulado, pois tenho a consciência de que não foi por acaso ou por falta de oportunidades.

Prometi reconsiderar minha decisão, motivada pela fortíssima - quase intransponível - influência que ele exerce sobre nós mortais que lidamos com as letras, informando-o que em muito breve voltarei às suas obras completas para teatro. Ele me pareceu mais satisfeito, até esboçou um enigmático sorriso.

Foto de Luísa Cid.
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