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domingo, 9 de dezembro de 2012

O RESGATE DE MEMÓRIAS E DE UM LP PERDIDOS AO SOM DO SUPERTRAMP

Em épocas de vacas magérrimas andei vendendo uns LPs que tinha em casa. Um deles, o primeiro de rock que comprei, sempre me causou arrependimento: "Paris", o duplo ao vivo do Supertramp. Os motivos são obviamente o valor sentimental, e também porque o repassei para um colega do jornal "O Fluminense" com os encartes, com as fotos do antológico show, que me haviam sido dados por Big, meu mais que amigo, um irmão. Quando me dei conta da burrada que fiz, já havia perdido os discos que tantas vezes ouvi com emoção e os encartes, com um papel de qualidade da época do lançamento do LP no Brasil e não o posterior, bem vagabundo, dos tempos do famigerado Plano Cruzado. Agora, com o lançamento do DVD "Live in Paris '79", que já adquiri e vi uma vez, resgato muito daquilo que perdi, vivi e imaginei.

A primeira vez que ouvi um disco do Supertramp foi justamente esse, o mais importante do grupo, um LP duplo ao vivo que registrava uma turnê de 1979 na capital francesa. Lançado em 1980, fui me deparar com ele na casa de um grande amigo no início daquela década. Já conhecia "The logical song" e "Take the long way home", duas faixas que haviam tocado muitas vezes nas rádios FM desde que o LP anterior "Breakfast in America" (1979) havia sido lançado, mas isso só soube alguns anos depois. Nenhuma das outras músicas eu conhecia e fiquei paralisado, querendo escutar sem parar.

Pouco tempo depois teria o meu exemplar, mas com uma pequena decepção: sem os encartes com as fotos do show que havia no disco de Francis, amigo de Kunta, na casa de quem estávamos. A partir daí ouvi aqueles dois LPs uma infinidade de vezes, inclusive em fita cassete, pois o gravara para continuar curtindo no meu velho gravador a pilha nas muitas viagens de carro que fizemos, eu e minha família, a bordo da velha Brasília 1975 de meu pai. Além do futebol e dos grandes amigos que já tinha e os que foram conquistados, foi principalmente a música do Supertramp que me salvou de mim mesmo na adolescência. Época muito complicada que encobriu com uma grande sombra a alegria natural da infância. Meus anos de chumbo tardios.


Escutando quase sempre deitado no sofá ou no chão da sala no moderno aparelho de som que tínhamos em casa, com um headfone confortável e de excelente qualidade, eu podia ouvir detalhes das músicas e da reação do público parisiense. Quantas vezes não me arrepiei com os mesmos pontos do disco, num eterno retorno de emoções. E ficava com aquelas músicas na cabeça o dia todo, mesmo sem entender muita coisa das letras, mas intuía o tema, o ambiente, o som me levava a muitos locais meus que desconhecia e a outros, como Paris, que até hoje não conheço. E aquilo me impulsionou a escrever, algo que já fazia muito esporadicamente, mas que se tornou mais intenso. Só muitos anos mais tarde viria a descobrir que não teria como me apartar disso nunca mais.

Depois de "Paris" comecei a comprar os outros LPs do grupo, porque queria conhecer mais músicas e saber mais sobre Roger Hodgon (composições, voz, teclados e guitarra), Rick Davies (composições, voz, teclados e harmônica), John Anthony Helliwell (sopros, teclados e voz de apoio), Dougie Thomson (contrabaixo e voz de apoio) e Bob Siebenberg (bateria) e a história deles. Não recordo a ordem de aquisição, mas imagino que tenha sido esta: "Even in the quietest moments" (1977), "Crime of the century" (1974), "Breakfast in America" (1979), "Crisis? What crisis?" (1975), "Indelibly stamped" (1971) e "Famous last words" (1982), que acabou sendo mesmo as últimas de Hodgson na banda, para minha tristeza. Nunca consegui encontrar o primeiro, de 1970, que tinha o nome da banda, mas a internet já me permitiu não só finalmente conhecer a capa - que nos 80 já me diziam ter uma flor, mas nunca me mostraram - como ouvir todas as faixas.

Davies e Hodgson sempre casaram perfeitamente suas excelentes vozes desde o início, embora o som do grupo nos dois primeiros discos fosse mais sombrio e bem diferente do que se tornaria a partir do monumental "Crime of the century", o primeiro com Helliwell, Thomson e C. Benberg (como o americano grafava seu nome por estar clandestinamente na Inglaterra) a formar o quinteto titular no coração dos fãs. "If everyone was listening", única faixa não incluída em "Paris" deste LP de 1974 é tão boa quanto as outras sete. Os arranjos muito bem elaborados e as quebras de ritmo no meio das músicas, com uma mescla de jazz, blues, rock e pop, e letras de questionamentos profundos e ótimo humor, para mim sempre foram a grande marca da banda. Soube usar o pop com muita inteligência e originalidade, tanto que não conheço até hoje nenhuma banda semelhante. Se alguém conhecer que me apresente.


Depois que Hodgson deixou a banda ainda comprei os dois LPs seguintes ("Brother where you bound", de 1985, e "Free as a bird", de 87) e o primeiro solo do dono da voz aguda do Supertramp, "In the eye of storm", de 1984, mas nenhum me agradou por completo. Tive depois a oportunidade de ver o Supertramp na Apoteose, em 1988, e Hogdson, no antigo Metropolitan, dez anos depois, mas ficou claro para mim, tanto num espetáculo como no outro, a falta que um faz ao outro.

Supertramp está longe de ser a melhor banda da história, com o passar do tempo ela deu lugar a muitas outras na minha vida e perdeu o posto de predileta para o Pink Floyd já tem muito tempo. Mas ela sempre ficará guardada em mim com muito carinho, pois como disse acima ajudou a tornar a minha adolescência mais tolerável e me abriu muitas portas, de sensações e percepções.

P.S: uma briga judicial ameaça impedir que o DVD continue à venda. Portanto, quem quer adquiri-lo é bom ser rápido.

 

Ilustrações: capa do DVD "Live in Paris '79"; Roger Hodgson, Dougiew Thomson e John Anthony Helliwell; capa do LP "Paris" e Roger Hodgson e Rick Davies.

Vídeo: "Crime of the century (Hogson/ Davies), Supertramp.

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