Histórias são feitas pra se contar. Então, lá vai mais uma pra coleção.
Não fui um ouvinte assíduo da rádio Fluminense FM nos anos 80, mas sem dúvida ela fez parte da minha vida. Mas, você deve estar se perguntando, por que não fui um ouvinte assíduo? Primeiramente porque só passei a curtir rock, rock mesmo, a partir de 1984, quando o primeiro Rock in Rio já se anunciava (e a Maldita foi diretamente responsável pelo line up do festival), e em segundo lugar porque no Rio de Janeiro, capital, especialmente na Zona Norte, onde eu morava, a qualidade do som da rádio não era tão bom quanto de outras emissoras.
Porém, como a qualidade das bandas e das músicas que tocavam lá era, em geral, excelente pro meu gosto, sintonizei não poucas vezes no 94,9Mhz, o dial da Maldita. Além disso, tive e tenho (como se vê na foto que fiz aqui em casa do disco de estreia do Marillion) LPs com o selo de qualidade essencial pra qualquer roqueiro confiar na compra de um álbum de uma banda desconhecida - ou ainda não muito famosa - do público do Rio naquela época. Em outros estados não sei se existiu algo semelhante, mas no RJ o selo "Aprovado pela Fluminense 94,9 FM" era o atestado de qualidade fundamental pra qualquer roqueiro que se prezasse. Você conhecia isso?
Uma das boas histórias mais remotas que me lembrei foi quando ouvi pela primeira vez o U2. Foi numa festa da faculdade, em meados dos 80, acredito que entre 1985 e 86 na casa de uma das colegas de turma, no Rocha, zona Norte carioca. Dois colegas e amigos, ambos chamados Guilherme, moravam em Niterói e eram ouvintes fãs da Flu FM. Um deles levou pra festa uma fita cassete do primeiro show do U2 lançado em disco gravada da Maldita. E ela tocou sem parar, pois todo mundo adorou a banda irlandesa de cara. Muitos ali nunca tinham ouvido o grupo de Bono Vox, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr.
Outras histórias se referem a ocasiões posteriores. O fim definitivo da rádio (ou do que ela realmente representou), no início dos anos 2000, levou alguns fãs a fazerem um pequeno protesto em frente ao prédio do grupo Fluminense, onde eu trabalhava (no jornal). Vi lá de cima, de uma janela do andar da redação do jornal, a diminuta aglomeração e um carro de som ecoando músicas que a rádio tocava postados na calçada da rodoviária de Niquite, bem em frente ao edifício em que ficava a Maldita.
Mais à frente tive a oportunidade de conhecer pessoalmente Luiz Antônio Mello, inclusive numa reunião de trabalho que ofereci a ele, mas que não foi à frente porque o projeto não obteve recursos suficientes pra ganhar vida. Infelizmente. Alguns anos depois ele me convidou a escrever um texto pro Blog do LAM (depois Coluna do LAM) e criei "Beleza e Caos: Arte em toda parte" , publicado aqui neste blog também, como você pode atestar clicando no título do texto aqui acima.
Como disse no início desta postagem, histórias são feitas pra se contar. Então, aí foi mais uma pra coleção. Espero que tenha curtido.
Escolher um disco favorito do Marillion da Era Fish, que é única que verdadeiramente me interessa, é tarefa impossível. O poeta e cantor escocês Derek William Dick tem a minha mais alta admiração desde os anos 80, quando comprei o meu primeiro LP do grupo, "Misplaced childhood". Daí em diante foi uma busca incessante por informações, músicas e discos, num tempo em que era dificílimo conseguir tudo isso.
Não é só, é claro, Fish que detém minha admiração, pois os outros integrantes da banda, Steve Rothery (guitarra), Pete Trewavas (baixo), Mark Kelly (teclados) e Ian Mosley (bateria) são ótimos, especialmente o guitarrista (o atual vocalista, Steve Hogarth, não me agrada). Porém, aquele gigante escocês que tive o privilégio de ver em ação no antigo Metropolitan, no Rio de Janeiro, em meados dos anos 90, sempre foi o centro das minhas atenções. Vi quase na mesma época, no mesmo local, a banda com o atual cantor e não gostei, especialmente das músicas criadas antes da troca de comando ao microfone.
Se escolher um disco do Marillion com Fish, que foi de 1979 a 88, é difícílimo, imagine uma das muitas excelentes músicas do grupo. Mas resolvi pinçar "That time of the night (The short straw)", do último disco de estúdio gravado com Fish: "Clutching at straws". E decidi apresentar aqui, como já fiz em outras ocasiões desta série "Música pra viagem", a versão ao vivo na apresentação de 1987, na Alemanha, que foi gravada no DVD "Live from the Loreley", cuja cópia já vi e revi muitas e muitas vezes, e também a de estúdio, que é mais completa.
Paul McCartney em ação no histórico show de abril de 1990 no Maracanã. Foto: Tim Sharp/AP
Histórias são feitas pra se contar. Então, lá vai mais uma pra coleção.
Com a notícia da vinda de Paul McCartney a Florianópolis em outubro, para se apresentar na Ressacada, estádio do Avaí, lembrei-me logo de um dos dias mais intensos da minha vida, repleto de reviravoltas.
Tudo ocorreu em 21 de abril de 1990. Trabalhava eu como repórter em início de carreira do Jornal dos Sports e fora escalado para, na manhã daquele sábado, ir às Laranjeiras cobrir um treino do Fluminense, em substituição a um dos setoristas do clube que certamente estava de folga. Não tenho lembranças daquele corriqueiro treinamento, mas sim da minha chegada à redação, por volta do meio-dia.
Estava preparado para bater as matérias, entregá-las ao redator, e dali passar pelo Maracanã para comprar dois ingressos do show que Paul McCartney faria à noite, no então maior estádio do mundo, pra mim e minha namorada, que me aguardava no apartamento da minha mãe, no Grajaú. A intenção era almoçarmos, descansarmos à tarde e partirmos no início da noite para curtir o espetáculo do ex-Beatle com amigas e amigos dela que viriam de Niterói.
Abre parêntese: é, naquele tempo comprávamos os ingressos a poucas horas de um show, mesmo gigantesco como aquele, no próprio local. E era a primeira vez que Macca se apresentava no Brasil. Não por acaso bateu, naquela sua segunda noite no Maracanã, o recorde mundial de público pra um show de artista solo: 184 mil pessoas. Fora os caronas, algo mais do que habitual no velho Maraca. Fecha parêntese.
Voltando à velha redação do prédio rosa da Rua Tenente Possolo, no Centro do Rio, que já não existe mais há muitos anos. Ao chegar lá, das Laranjeiras, fui abordado por um dos chefes de reportagem com cara de apreensão. "Lamas, estamos sem repórter pra cobrir o enterro do Vagner Bacharel, você pode ir?". Fui pego no contrapé, mas rapidamente solicitei: "Eu ia comprar os ingressos pro show do Paul McCartney depois que saísse, tem alguém que possa fazer isso pra mim?". "Sim, mando o contínuo comprar". "Beleza, são dois ingressos, está aqui o dinheiro. Obrigado". "Obrigado". Foi mais ou menos isso.
Por telefone, avisei a Cristine, que de namorada se tornaria minha mulher naquele mesmo ano e, posteriormente, mãe dos meus três amados filhos antes de partir precocemente para o Mundo Espiritual, 13 anos e 7 meses depois daquele louco sábado. Bati tranquilamente as matérias sobre o que ocorrera e o que apurara nas Laranjeiras, fui à rua almoçar e um tempo depois fui de carro com o fotógrafo Uramar de Assis para o mesmo cemitério em que meu pai havia sido enterrado quatro anos antes, em Sulacap, com a triste incumbência de fazer a cobertura do sepultamento do bom zagueiro, que na época atuava no Paraná Clube, e já havia defendido Botafogo, Fluminense, Palmeiras, entre outros.
Vagner falecera no dia anterior, em Curitiba, alguns dias após um forte choque de cabeça num jogo do Paraná pelo Campeonato Paranaense. Era carioca, por isso foi sepultado no Rio de Janeiro. Tinha apenas 35 anos, apenas dois a mais que Cristine quando ela também partiu, em 2003.
Após o enterro, onde pude entrevistar vários ex-companheiros de Vagner, o então auxiliar-técnico da seleção, Nelsinho Rosa, e o então técnico Rubens Minelli, que trabalhava no Paraná, voltei para a redação do JS na expectativa de bater a matéria, dar uma passada rápida no Grajaú para tomar um banho e ir ao tão aguardado show.
Porém, ao chegar ao prédio rosa, perguntei pelos ingressos e o chefe de reportagem me deu uma desculpa esfarrapada que agora não me recordo pra me dar a desesperante notícia: nada de ingressos. Liguei imediatamente para Cristine, pedindo a ela que fosse o mais cedo possível para o Maracanã, comprasse os ingressos e me encontrasse onde todo mundo combinava de se encontrar: em frente à Estátua do Bellini (oficialmente, Estátua do Jogador). Já não daria mais para ir ao Grajaú, partiria mesmo direto para o velho estádio, que ainda completaria 40 anos de inauguração.
Num tempo em que não havia celular, sequer internet (bati as supracitadas matérias nas velhas máquinas de escrever), fizemos nossa comunicação nos velhos telefones fixos e agora era rezar para tudo dar certo. Estava muito puto da vida com o chefe de reportagem (vou ocultar o nome dele, porque águas passadas não movem moinhos - ô clichezão!! - e também porque na época mesmo não houve qualquer mágoa, rusga, nem mesmo discussão. Segurei a onda, eu era um foca ainda, é bom ressaltar).
Bati a triste matéria do adeus a Vagner, entreguei a um redator, aguardei minha liberação e fui direto para o Maracanã. Cheguei à Estátua do Bellini (ou do Jogador), creio que umas 19h, 19h30. O show acho que estava marcado para começar às 21h. E lá tranquilo fiquei à espera de minha namorada, com cada vez mais gente à minha volta.
O tempo, porém, como sempre, desde que o mundo é mundo, foi passando, passando, passando, e comecei a me impacientar, rodando em torno do monumento, dando até uma afastadinha de vez em quando para ter uma visão melhor no entorno, o que ficou muito mais difícil devido à multidão que já circulava por ali.
Depois de muito esperar, já achando que a possibilidade de ver Paul McCartney em ação era cada vez mais remota, pois creio que só faltava menos de meia hora para o início do espetáculo, eis que surge em meio a diversas pessoas o rosto de uma amiga da Cristine que eu já conhecia. Ela arregalou os olhões que já eram grandes e, naquele instante, ficaram gigantescos à minha vista. No entanto, em vez de vir em minha direção, saiu correndo para o lado oposto. Fiquei sem entender, mas decidi ficar onde estava, pois no mínimo a amiga sabia que eu me encontrava ali onde fora combinado.
Quando ela retornou, com Cristine e as demais pessoas do grupo, todas esbaforidas, depois de um tempo consegui entender o que se passara: sem conseguir me encontrar e com o horário do show se aproximando, minha namorada tinha acabado de vender o meu ingresso para alguém. Antes que eu me desesperasse, contaram que ela conseguira recuperar a entrada e pudemos finalmente entrar para assistir ao showzaço de Paul McCartney, do gramado, onde tantos deuses do futebol pisaram, muitos aplaudidos por mim das arquibancadas, cadeiras e ou geral.
Foi um dos melhores que tive o prazer de ver, dançamos e vibramos muito e ainda voltamos para o Grajaú, andando um bom pedaço (acho até que fomos direto a pé, por causa da aglomeração gigantesca nos arredores do estádio, mas não tenho certeza disso). Mesmo exaustos, comemos e bebemos num restaurante que não existe mais, na Praça Edmundo Rêgo. Eu, certamente o mais cansado de todos, não arredei pé até ir para casa da minha mãe, finalmente tomar um banho e encontrar a cama, já na madrugada de domingo.
E hoje, mais de 24 anos depois, ainda posso rever o show graças às maravilhas que o YouTube nos traz. Curta também aí abaixo.
Histórias são feitas pra se contar. Então, aí foi mais uma. Espero que tenha curtido.