quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

UM TANTO DE GRANDEZA E MUITO DE CORAGEM

Neste último dia deste ano complicado, cheio de altos e baixos, gostaria de manifestar meu desejo de compartilhar com todos que façam por merecer as maiores alegrias do mundo em 2016, aquelas muitas que temos deixado de lado por puro egoísmo. Mesmo aos que não têm feito muito bem aos outros (e a si, por inevitável conseqüência), desejo de coração e alma que melhorem (muito!). Para isso precisarão, como todos, de muita saúde, muita paz e plena felicidade. 

E vamos agora, então, ao primeiro dos muitos anos de colheita, porque já semeamos muito e a lição já sabemos de cor. Não, já não nos resta mais aprender, falta só praticar mais e mais. E sempre mais. Ter bondade, é sim, ter muita coragem. Portanto, a partir deste momento, tenhamos um tanto de grandeza e muito de coragem. É o que desejo a todos nós!

PS.: grato a Beto, Renato e Cazuza, que sem saber me ajudaram a concluir este texto. E a Michel, por ter trazido ao mundo a música abaixo, além da Kristina e o pianista que não sei o nome, por executá-la tão bem, e também a Flávio, Milton e Murilo (autor de belíssima letra), que me fizeram conhecê-la ainda em meados dos anos 80. Até 2016!


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Conexões

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

QUESTÃO EM QUESTÃO 6

Percebendo que o radicalismo político se acirra dia a dia no país e que há um lado crescente defendendo intervenção militar (filme, aliás, já visto em 1964), veio-me à cabeça uma questão atroz e deveras perturbadora: se a maioria quiser a ditadura, a democracia terá de aceitá-la?

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domingo, 15 de novembro de 2015

TEMPLOS E ESPETÁCULOS

Na infância e na adolescência, o lugar que eu mais gostava de ir era ao Maracanã, onde assisti a grandes espetáculos. Com a progressiva queda da qualidade nos campos de futebol e o meu crescente interesse pelas artes, fui aos poucos mudando de templo, e é no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) que passei a ver a maior parte dos grandes espetáculos que me fazem sair melhor do que quando entro. Espetáculos que justificam o nome. E por um preço muito menor do que se paga no ingresso para se ir ao estádio (hoje arena), onde não piso desde 2009. Um lugar em que se pode até apenas ficar, circular, sem nada pagar, que já vale muito a pena.
Ontem, mais uma vez saí de lá extasiado, após assistir à grandiosa apresentação do Barbatuques dentro do Festival Brasil Vocal CCBB 2015. Um misto de dança e música, com percussão, melodias, harmonias e solos feitos com corpos e vozes de 10 grandes artistas, quase um time de futebol. Se visse hoje um time brasileiro com tamanho talento, determinação, inventividade e entrosamento, passaria a ser o meu de coração, mesmo que vestisse um uniforme que normalmente não me agrada.
No futebol, se o jogo fosse maravilhoso, mas meu time não ganhasse, saía frustrado. A grande vantagem dos eventos artísticos e culturais é que não há chances de isso acontecer, porque mesmo quando a qualidade não é tão alta, algo raro no CCBB, sempre se aprende algo. Outra diferença é que na época de torcedor tinha praticamente só o Maracanã para ir, freqüentei muito pouco outros estádios do Rio, a grande maioria muito ruim (a única exceção era São Januário, onde fui muito mais como repórter do que como torcedor). E no caminho que escolhi percorrer, há além do CCBB outros templos da arte e da cultura nesta maltratada cidade. Se não tão grandiosos, são tão generosamente abertos à arte quanto. E hoje, é a arte que me move.
PS.: na sexta, eu e minha mulher já havíamos assistido a um grande show, no Cariocando, capitaneado pelo meu amigo Carlinho Motta e Agenor Neto, com participações especialíssimas das cantoras Dilma Oliveira, que fez a platéia ficar de pé, e Geovana Martins. 


Vídeo: "Kererê", com o Barbatuques (aqui com quatro integrantes a mais do que no show que vi no CCBB).
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Músicas que nos fazem viajar 2
Os sopros mágicos de Carlos Malta
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terça-feira, 22 de setembro de 2015

PENSO, LOGO SINTO 22

O fato de um criminoso ter curso superior, pós-graduação, ter exercido cargos públicos e privados importantes e outros títulos deveria ser agravante (quanto mais títulos, mais grave a pena) e não atenuante. Mas como se sabe, por estas terras...

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Penso, logo sinto
Estilhaços 15

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

O INESQUECÍVEL SHOW DO QUEEN


Tinha eu 18 anos (faria 19 em julho), quando em 18 de janeiro de 1985, uma sexta-feira como esta, assisti ao meu primeiro show internacional de música. Os dois primeiros, de B52's e Gogo's, tiveram a minha presença na antiga Cidade do Rock, mas se já não gostava na época, muito menos agora posso considerá-los. Para mim o primeiro foi o do Queen, que fechou aquela noite memorável. O Queen mesmo, com o grande Freddie Mercury à frente, comandando uma massa de aproximadamente 250 mil pessoas.

A ida ao primeiro Rock in Rio foi ansiosamente esperada, eu comprara meus ingressos em outubro de 84, no Banco Nacional da Praça da Bandeira (hoje mais uma igreja destas muitas que se espalham por todos os cantos deste país), com a grana do meu salário de estagiário no arquivo da Caixa Econômica Federal, que ficava ali do lado, no prédio que atualmente é da Universidade Veiga de Almeida. E levei para casa os ingressos pros três últimos dias, sendo que o show que mais queria ver,  perdi: o do Yes, que fechou brilhantemente aquele primeiro festival, no domingo, dia 20.

A empolgação era tanta que, no lamaçal formado naquele verdadeiro pântano pelas fortes chuvas que caíram nos dias anteriores, e mantidos por alguns pingos grossos esparsos nos dias 18 e 19, joguei tanta energia fora que minhas pernas não agüentaram e fiquei em casa no dia 20 (e 21 também, faltei ao trabalho, como já fizera três dias antes). Foi uma canseira além do normal, pois minha forma física não era das piores na época, o sonho de ser jogador de futebol havia sido frustrado tinha pouco tempo.


Ainda vi, no dia 18, as fracas apresentações do Kid Abelha, do Eduardo Dusek (o melhor nacional do dia) e Lulu Santos (que tive a oportunidade de assistir em muito melhor forma outras vezes) e, no dia seguinte, os ótimos shows de Pepeu e Baby, Whitesnake, Ozzy Osbourne, Scorpions e AC/DC, mas nenhum comparável ao do Queen.



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Há 40 anos, o adeus de Jimi Hendrix
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"Bohemian Rapsody", emocionante rock dos branquelos loucos 

terça-feira, 25 de agosto de 2015

quinta-feira, 23 de julho de 2015

"PROFANO CORAÇÃO" ESTÁ DE VOLTA

Lançado originalmente em 20 de julho de 2009, "Profano Coração" foi reeditado em versão digital com algumas modificações e quatro poesias extras. O livro está à venda em qualquer lugar do mundo pelo site da Amazon. Para comprar no Brasil é só clicar na capa ao lado e adquirir o seu. Se gostar, recomende a todos que conhecer, agradeço encarecidamente desde já.

Veja o que a premiadíssima cantora Ithamara Koorax escreveu sobre o que leu: "Lindo e muito tocante. É difícil encontrar as palavras certas nessas horas. Você contorna tantas situações da vida e da morte, da dor, do sangue, enfim, realmente é um Profano Coração. Belo demais. Ficarei relendo e descobrindo novas sutilezas. Gostei muito também das ilustrações, realmente são sensacionais. Parabéns ao Sóter, cujo trabalho eu não conhecia."

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Poesia sem versos
"Profano" conquista corações

sábado, 11 de julho de 2015

A PROPÓSITO DO JORNALISMO, O QUE TENHO EU A DIZER

Foram 25 anos de respeito, carinho, muitas e importantes amizades, imensos aprendizados, ótimas oportunidades e abertura de portas. A última delas puxada e empurrada pela maçaneta com muito cuidado por minhas próprias mãos, em 1º de abril de 2013. No entanto, não houve amor. Por isso - e só por isso - afirmo que se encerrou. Hoje, dia 7 de abril*, soube que se comemora o dia do jornalista porque vi nas redes sociais e acabei sendo parabenizado por amigas e amigos que ainda me consideram jornalista. Não me considero mais, não por desprezo, rancor, nada disso, muito pelo contrário. É por respeito mesmo, por saber que embora tenha cumprido minha missão da melhor maneira que eu podia fazer dentro de redações - indo da máquina de escrever igual a esta da foto à internet - em estúdios de rádio (por pouco tempo), nas ruas, estádios, festivais etc, jamais tive o mesmo orgulho e paixão que colegas com muito mais talento e vocação que eu têm por esta profissão ao mesmo tempo tão nobre e tão miserável, como bem definia o falecido Nelson Silva.

Para começar, amava aquilo que me levou a fazer vestibular para jornalismo: o futebol. Como não tinha mais idade, nem tinha me dedicado o suficiente para me tornar jogador e a concorrência naqueles tempos (início dos anos 80) era “desleal”, optei pela profissão que poderia me proporcionar a chance de trabalhar com aquilo que tomava grande parte dos meus dias. Amava – e amo - a música também, mas ela não me levou ao jornalismo. A profissão que abracei de 1988 a 2013 me deu gigantescos presentes e só tenho a agradecer. Um deles foi (re)descobrir o amor pela literatura e a arte em geral, sendo que o teatro foi exceção, pois, como já escrevi aqui em outras oportunidades, foi presente de Cristine Cid, minha namorada e mulher nos seus últimos 15 anos de vida e mãe dos meus amados filhos**.

Ser repórter me deu a chance de entrevistar e, portanto, conversar com Oscar Niemeyer, Zico, Júnior e quase todo o time do Flamengo campeão do mundo em 1981, Telê Santana, Paulo Roberto Falcão, Carlos Alberto Parreira, Nelson Pereira dos Santos, Paulinho da Viola, Beth Carvalho, Carlos Eduardo Dolabella, Evandro Mesquita, Geovani, Antonio Soares Calçada, Eurico Miranda, Marcio Braga, Roberto Dinamite, Romário, Bebeto, Zagallo, Carlos Alberto Torres, Jairzinho, Paulo Cesar Caju, Sergio Cabral (pai), Luiz Mendes, Levir Culpi, Afonsinho, Bebeto de Freitas, Tande, Giovanne, Mauricio, Bernard, Luiza Parente, Mauricio de Sousa, Veronica Sabino, Ithamara Koorax, Carlinhos Brown e mais uma infinidade de nomes mais ou menos conhecidos, mais ou menos amados e odiados. Fora os que esqueci ou não tenho certeza.

Também me proporcionou histórias pitorescas e incríveis, umas que acabaram não publicadas, como a expulsão da sede do Bangu pelo então presidente do clube da Zona Oeste do Rio e atual mandatário da Federação de Futebol do Rio de Janeiro; outras que foram para as páginas de uma revista apenas parcialmente, como as voltas que dei para descobrir onde morava Jorge, lateral do Vasco na époda do Expresso da Vitória e da seleção nos anos 40 e 50, e como acabei sabendo que era na Praia de Botafogo, a poucos metros de onde estava, e que para saber disso fui via Embratel a Jaboatão, em Pernambuco, onde morava o filho dele de mesmo nome, com quem não falava havia 30 anos, e a de Kalu, já contada neste blog (para ver, clique aqui).

Ser jornalista me deu a oportunidade de, entre muitos eventos importantes, fazer parte da equipe de redação do Jornal dos Sports na cobertura da Copa do Mundo de 1990, na Itália; chefiar a equipe da Agência Sport Press na cobertura das Olimpíadas de 1992, em Barcelona, e das eliminatórias da Copa do Mundo de 1994, disputadas no ano anterior; cobrir da redação do jornal O Fluminense a Copa dos Estados Unidos e as Olimpíadas de 2000; ser responsável pela equipe de redação do O Globo Online durante a Copa de 1998, na França; ser chefe de reportagem da Agência Lance! nas eliminatórias para Copa de 2002 e no próprio Mundial disputado na Coréia do Sul e no Japão, e fazer parte da equipe de redação do Globoesporte.com durante os Jogos Pan-Americanos Rio-2007, das Olimpíadas de 2008 (Pequim) e 2012 (Londres), além da Copa do Mundo de 2010, na África do Sul. 

O jornalismo me fez ler e procurar saber mais sobre assuntos que sempre adorei e também sobre aqueles que jamais despertaram meu interesse, como mercado financeiro, automóveis, informática, aviação. O jornalismo melhorou muito a minha escrita, até o ponto de me permitir criticar a forma como se escreve determinadas matérias e artigos. O jornalismo me apresentou o jornalista Gabriel García Márquez, o que me fez preferir seus "As aventuras de Miguel Littin Clandestino no Chile" e "Notícias de um Seqüestro" a "Cem Anos de Solidão" e "Amor nos Tempos do Cólera", ambos ótimos e justamente consagrados. O jornalismo me fez crescer profissional e pessoalmente graças aos muitos excelentes colegas com os quais tive a sorte de trabalhar na mesma equipe, na mesma empresa ou nas mesmas coberturas. Não citarei nenhum para não cometer injustiças.

Por essas e outras - que não relatei por esquecimento ou edição - pude reunir em 25 anos algumas amizades de inestimável valor, obter muitos aprendizados talhados por crassos erros e inesperados acertos, receber grandes oportunidades que foram bem aproveitadas umas, nem tanto outras. Foi eterno enquanto durou, por isso não foi amor, pois amor, o amor não acaba.



* Escrevi este texto no dia 7 de abril e ele ficou aqui no rascunho pra ser publicado posteriormente.
** Hoje, 11 de julho, dia em que finalmente publico este texto, Cristine Cid completaria 45 anos de idade.
Vídeo: "Feito Mistério" (Cacaso/Lourenço Baêta), com Boca Livre
Veja também:
A Terra de Salgado
Questão Em Questão 2
O Jornalismo Em Questão
O Escrever
Entressafra
Outras Considerações sobre o Escrever

quinta-feira, 18 de junho de 2015

ESTILHAÇOS 15

Se você olha para o céu e pensa na vastidão que nos cerca, que a Terra - com bem disse Carl Sagan - é apenas um pálido ponto azul, lembre-se da imensidão das coisas minúsculas que passeiam pelo ar, através do nosso corpo, abaixo de nossos pés, dentro da terra, da água, das células, das moléculas, dos átomos. Há neste mundo invisível, tão invisível quanto o grandioso universo e todas as suas galáxias, também muito de espantoso, terrível, maravilhoso e misterioso.



Veja também:
Estilhaços 11
Estilhaços 8
Penso, logo sinto 15

terça-feira, 9 de junho de 2015

MÚSICA PRA VIAGEM: UM A ZERO

Pixinguinha
Não há, no meu modo de ver, música que retrate melhor o futebol do que o choro "Um a Zero", de Pixinguinha e Benedito Lacerda. Em especial o futebol brasileiro, aquele que durante décadas e mais décadas foi considerado por público e crítica o melhor do mundo (mesmo quando não vencia a Copa). Sempre que a ouço, nos mais variados arranjos, com os mais diversos feras do chorinho, logo me vêm à memória imagens de Garrincha dominando a bola, levando adiante, encarando um, dois, três marcadores, driblando, parando, fingindo avançar, voltando, colocando o pé sobre a bola, dando uma paradinha, um tapa nela pro lado direito e se livrando de mais um "joão", chegando fácil à linha de fundo e com a aproximação de mais um adversário, retorna para entrar na área...

Garrincha em ação na Copa de 1962
Porém, as imagens que fizeram a música surgir são bem mais antigas. Em 1919 - portanto 14 anos antes de Manoel Francisco dos Santos, o Garrincha, nascer em Pau Grande, interior do Rio de Janeiro -, o mestre Pixinguinha, um dos maiores compositores da História da música, e seu parceiro Benedito Lacerda compuseram "Um a Zero" em homenagem à vitória da seleção brasileira sobre o Uruguai, na final do Campeonato Sul-Americano, pelo placar que dá título à obra-prima. A dramática partida foi realizada no dia 29 de maio daquele longínquo ano, no estádio das Laranjeiras, construído especialmente para aquela competição, que reuniu ainda argentinos e chilenos. O gol da vitória foi marcado na segunda prorrogação, aos 122 minutos de jogo (!), por Arthur Friedenreich, "El Tigre", apelido que ganhou dos uruguaios justamente por este feito histórico. Friedenreich já foi tido como o maior artilheiro da História do futebol, mas há muitas controvérsias em relação ao número de gols que marcou ao longo de sua carreira, no período amador do futebol brasileiro, que vai até 1933.

Friedenreich

Certamente a emoção da conquista, a segunda da seleção brasileira (a primeira foi a Copa Roca de 1914), inspirou os dois artistas a criarem uma música à altura. Conseguiram, talvez até tenham superado. Muitos anos depois Nelson Angelo pôs letra neste chorinho, porém isso nem sempre me agrada, prefiro quase sempre a versão instrumental. Mas esta é outra discussão para uma outra hora. Fiquem abaixo com Pixinguinha neste clássico "Um a Zero".


Veja também: 
Músicas que nos fazem viajar
Garrincha, 77
Agradecimento a Altamiro

quinta-feira, 21 de maio de 2015

A TERRA DE SALGADO

"Não sabendo que era impossível, foi lá e fez" (Jean Cocteau ou Mark Twain)

Nunca programei com tanta antecedência assistir a um filme como O Sal da Terra. Desde que li em setembro do ano passado uma matéria de capa na Ilustrada (caderno de cultura da Folha de S.Paulo) acerca do documentário sobre Sebastião Salgado, dirigido pelo seu filho, Juliano, e Win Wenders, tive tanta vontade de vê-lo que me antecipei e comecei a buscar vídeos no youtube de entrevistas e especiais sobre o estupendo fotógrafo e humanista brasileiro. 

Desde então, Sebastião Salgado passou a ser mais uma grande referência para mim. Não que desconhecesse o trabalho dele, mas passei a conhecê-lo com mais profundidade: o artista, sua obra e, principalmente, sua visão de mundo e o seu legado para o Brasil e a Humanidade.

Pois bem, só consegui ir ao cinema ontem, dia 20 de maio de 2015, acompanhado de minha mulher, já com algumas semanas de exibição nas telas do Rio (a esmagadora maioria localizada na Zona Sul da cidade). Este tempo em cartaz é na verdade outro grande feito, pois é raríssimo um documentário sobre um ilustríssimo brasileiro que, infelizmente pouquíssimos conterrâneos sabem de quem se trata, não ser retirado poucos dias depois de sua estréia. E o melhor é que a pequeníssima sala 2 do Estação Botafogo estava lotada.

O que me mostrou o filme já não me era totalmente ignorado, justamente pelo imenso interesse que tive por ele desde que soube de seu lançamento na Europa. Porém, ainda assim me surpreendeu, ensinou, me comoveu, me modificou para melhor. 


Apesar de algumas fotos fortíssimas, de gente com fome, assassinada por inanição, bala ou facão, cenas de refugiados de guerra, nada é repetitivo ou cansativo. A vida e a obra deste brasileiro – sempre acompanhado e auxiliado por sua espetacular mulher, Lélia -, expulso de seu país por se opor à nefasta ditadura militar que nos abateu a partir de 1964, é sempre tão surpreendente quanto as suas fotos.

É necessário que se veja e reveja por muitas e muitas vezes este filme e a obra de Sebastião Salgado. Além de um fotógrafo de extrema sensibilidade, coragem, talento e precisão, ele é um humanista e ambientalista – assim como Lélia Werneck Salgado, é sempre bom que se frise - que deixará para os mais jovens e as futuras e futuras gerações o Instituto Terra (www.institutoterra.org). 

Este projeto replantou em Aimorés, cidade mineira do Vale do Rio Doce, no então ressecado solo da fazenda onde Salgado foi criado por seus pais, juntamente com as seis irmãs, 2,5 milhões de árvores desde 2001, transformando o que era pasto novamente em floresta (como na sua infância), recuperando assim uma parte da Mata Atlântica que tinha sido arrasada pela estupidez humana.

E a estupidez humana foi o que mais este xará do meu falecido pai presenciou e documentou desde que, no início da década de 1970, resolveu abandonar a promissora e segura carreira de economista para se lançar na incerta e autônoma profissão de fotógrafo, ainda mais incerta pelos perigos que teve de enfrentar para mostrar ao mundo o que se passava onde  ninguém gostaria de estar. 

E de tanto retratar os malefícios humanos nos quatro cantos do mundo, mergulhou no mais profundo poço do ser, afundou nos mares turvos da depressão, desiludido por completo da capacidade de nossa raça merecer viver, de estar na Terra. No entanto, foi este momento de crise, agravado pela morte de seu pai, que o fez retornar às suas origens, à Natureza. 

E, por encampar uma ideia aparentemente estapafúrdia de Lélia, construiu a sua maior obra. Ainda mais gigantesca que a sua imensa e importantíssima coleção de fotografias, penso eu. 

Isso se refletiu inclusive na escolha do seu mais recente projeto: Genesis. Revela Salgado que originalmente o planejamento era fotografar mais uma vez a horrenda influência humana na Terra, desta vez na poluição do planeta. Porém, a escolha recaiu sobre a esperança, e ele foi buscar as origens da Terra, onde ela ainda preserva características dos seus primórdios. E produziu mais um belíssimo trabalho, certamente o menos sofrido.

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Entrevista: Nelson Pereira dos Santos
Beleza e caos: Arte em toda parte


Sebastião Salgado, como tantos outros brasileiros de primeira grandeza, são infelizmente escondidos pela nossa mídia, com raríssimas exceções, claro – elas sempre confirmam as regras. Gente como ele, que retratou o sofrimento e a beleza dos povos do mundo inteiro e reconstruiu com a contribuição valiosíssima de sua mulher uma parte da Mata Atlântica, têm pouquíssimo espaço para a divulgação de tão grandioso trabalho. Ao contrário de pseudo-heróis criados pelo pobre jornalismo nosso de cada dia, eles, os verdadeiros gênios da raça, estão no quase anonimato.

Este filme, O Sal da Terra, deveria ser exibido em rede nacional no horário nobre por todas as emissoras de televisão, incluindo as pagas, de preferência no lugar do tragicômico horário eleitoral gratuito. Quem sabe assim, nosso rude, bruto, cruel e ao mesmo tempo fútil, infantil e carente país se sensibilizasse, do mais humilde ao mais pseudo-poderoso cidadão. E então, conscientes de seus irrisórios propósitos rotineiros, os abandonassem e se levantassem para fazer disso aqui um lugar mais justo e verdadeiramente saudável e feliz.

Lélia e Sebastião na Fazenda Bulcão, em Aimorés (MG)

"... Vamos precisar de todo mundo / Um mais um é sempre mais que dois / Pra melhor juntar as nossas forças / É só repartir melhor o pão / Recriar o paraíso agora / Para merecer quem vem depois..."
(O Sal da Terra, Beto Guedes/Ronaldo Bastos)




Fotos: a primeira, terceira, quarta e quinta fotos são de Sebastião Salgado.


sábado, 25 de abril de 2015

OUTRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESCREVER

Escultura de Auguste Rodin
Antes que alguém me pergunte ou faça qualquer observação sobre o tema: não, eu não gosto de escrever. Não que eu desgoste, deteste, despreze, não é isso, muito longe disso, aliás. Mas escrever é muito mais uma necessidade do que um desejo para mim. Ler, sim, é muito mais desejo que necessidade. Escrever me salva de mim mesmo e só se torna desejo quando a necessidade extrapola. O ato de pôr palavras e frases em ordem com (ou na desordem dos) meus pensa-sentimentos tenho certeza que têm me impedido de ficar louco ou morrer. Morrer mais no sentido de me anular, para ficar menos dramático, embora eu acredite piamente que signifique o mesmo. 

Ler é como alimento, mata a fome e satisfaz a vontade de comer, saborear, ter prazer. É como o amor, desejo e necessidade na mesma intensidade. Escrever raramente dá prazer, já até escreveram que dói, o que não foge muito da verdade, embora me pareça uma alusão meio exibicionista, pedinte de atenção. Muitas vezes o prazer vem depois da escrita, com uma leitura inteligente e sensível, principalmente quando surpreendente. No entanto, depende necessariamente de o leitor expor ao autor o que e como o leu.

Seja em prosa ou verso, tudo o que se escreve não pertence mais ao autor a partir de seu primeiro leitor. Daí, o eu não é mais de quem criou, se é que ele pensou mesmo em si na hora de escrever. Este ato que tanto pode ser nobre, quanto pobre, que carrega um status de ricaço decadente, é muitas vezes uma libertação, um grande alívio, um gozo solitário. O suor também é uma boa imagem para descrevê-lo, pois é mesmo aquilo que sai dos poros, dos poros da alma.

Embora seja um clichê, é verdadeiro dizer que a inspiração nada mais é do que nada, se não houver a transpiração. Uma boa idéia não surge do nada, ela está apenas esperando ser descoberta, captada, capturada por quem tem olhos livres o suficiente para enxergar o invisível bailando à sua frente, por quem tem mãos e dedos sutis e hábeis para agarrá-la com delicadeza. É como a escultura: ela já existe na pedra bruta, está apenas aguardando que o artista tire os excessos e a deixe transparecer.

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quinta-feira, 16 de abril de 2015

UM INESPERADO ENCONTRO NA MADRUGADA

Nas primeiras horas do último domingo, eu e um séquito de amigos e familiares saíamos de uma grande festa, quando nos deparamos com um grande e inesperado encontro. Distante ainda, eu o vi de costas, mas não tive qualquer dúvida, reconheci-o de pronto. Aproximei-me e solicitei a foto - sem selfie, porque senti que podia desagradá-lo com essas modernices. Meio a contra-gosto, ele aceitou fazer esta foto ao meu lado. Assustada com a nossa presença, a cabra vadia se esquivou, nada confessou e foi pastar em algum canto que não vi.

Na despedida, ia parabenizá-lo pela vitória do seu Fluminense sobre o Botafogo horas antes, quando o mestre ralhou seu descontentamento comigo: "Você não me lê mais, nem assiste mais a peças de minha autoria tem já uns dez anos". Fiquei um pouco encabulado, pois tenho a consciência de que não foi por acaso ou por falta de oportunidades.

Prometi reconsiderar minha decisão, motivada pela fortíssima - quase intransponível - influência que ele exerce sobre nós mortais que lidamos com as letras, informando-o que em muito breve voltarei às suas obras completas para teatro. Ele me pareceu mais satisfeito, até esboçou um enigmático sorriso.

Foto de Luísa Cid.
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O teatro e o futebol
Homenagem ao teatro

segunda-feira, 9 de março de 2015

ENTRESSAFRA

Nada pior para um escritor do que o período de seca. Ainda mais quando se alonga. Mesmo que idéias não faltem, elas teimam em não se transformar em palavras, frases, versos, ficam flutuando como nuvens brancas escondendo o sol sem ser sinal de chuva, se remexem dentro da cabeça, do corpo, ainda em gestação, sem estar no tempo de ganhar vida plena, esperando o momento certo de descer, fluir, nascer. 

Há muitos anos parei de me sentar em frente a uma folha em branco com vontade de escrever e lançando no papel (naquela época escrevia com caneta ou à máquina) o que me viesse à cabeça. Quase sempre saía sem verdade, superficial, sem verve. Por isso, passei a respeitar meu tempo. Mesmo assim é uma enorme agonia passar por essa entressafra.


Vídeo: "Amor de índio" (Beto Guedes/Ronaldo Bastos), com Beto Guedes

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O escrever
Manifesto de resistência
Mãe exalta o amor em "O filho de mil homens"
Conexões
A grandiosidade de Victor Hugo

sábado, 7 de fevereiro de 2015

CARNAVAL

No carnaval,
bate no peito
o silêncio
a cada toque surdo
do meu coração.


Vídeo: "Esta melodia" (Bubu da Portela/Jamelão), com Marisa Monte e Velha Guarda da Portela.
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Um encontro com Martinho da Vila
A questão do fânqui e o velho Angenor