sábado, 30 de janeiro de 2021

A MELHOR PROPAGANDA DE TODOS OS TEMPOS

O impacto que esta propaganda de TV me causou ainda ecoa em mim, passados mais de 30 anos. Não por acaso, sinto - e recentemente isso vem se repetindo - completa repulsa quando um tirano se aproxima, tangencia ou, muito pior, conquista o poder, ainda mais quando exibe grande popularidade, democraticamente ou não. 

Ecos dos passados remotos e recentes. Em tempos orwellianos, em que a História é reescrita com muitas mentiras disfarçadas de verdade ou, ainda mais grave, quando a evidência mais do que comprovada é negada; em tempos de terraplanistas em pleno Século XXI, relembrar esta propaganda que está no vídeo lá embaixo creio ser de grande importância.

Sem entrar em juízo de valor do produto em si, ao qual tenho cá minhas muitas críticas, mas também elogios, o texto fundamenta a ética jornalística, algo que uma parte nada pequena de veículos e comunicadores, de direita, de esquerda e de centrão sanguessuga, desconhece completamente. 

Não existe imparcialidade, isto é de uma obviedade rodrigueana, porém, jamais se deve esquecer a responsabilidade de informar corretamente e opinar com base nos fatos e não nos delírios e desejos, nem os mais sublimes, quanto menos os mais funestos.

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Outras considerações sobre o escrever

Nos 25 anos em que trabalhei como jornalista e tive o privilégio de conhecer grandes colegas, mais velhos, da minha geração e mais novos, tive em mente sempre a importância de agir corretamente, mesmo quando emitia alguma visão particular. Que no fundo é o que sempre há, a visão particular do repórter, do redator ou do editor que escreve. Já o que se publica muitas vezes depende muito da linha editorial (leia-se, comercial e política) do veículo. 

Fui apenas mediano como repórter e bom na retaguarda, tanto como redator, quanto como editor (ou sub), mas a ética sempre latejou em minha cabeça e ritmou o meu coração enquanto jornalista. O que não evitou que cometesse erros. Imagine quem se pauta pelas mentiras disfarçadas ou não que justifiquem seus desejos e delírios.

Para quem nunca viu, para quem não se recorda ou mesmo para quem (público leitor ou jornalista/comunicador) se lembra bem, vale muito prestar atenção no vídeo abaixo. Em tempos como os que estamos vivendo, a notícia, a informação, o comentário, a orientação, em suma a Educação, pois tudo se origina dela, são fundamentais, muito mais importantes do que nos raros momentos amenos que nos são permitidos neste país. 

Por fim, antes do vídeo com a propaganda, Millor Fernandes, sobre tudo - e um pouco mais - do que foi escrito acima: "Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados".


Obs.: A propaganda acima foi criada pela agência W/GGK, de Washington Olivetto.

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Entressafra
Crônica que nasceu no Boteco Taco
"O negro crepúsculo", um trabalho de 11 anos

domingo, 24 de janeiro de 2021

COM O CORAÇÃO CADA VEZ MAIS DISTANTE DO FLAMENGO

Não há novidade alguma - o que não impede de continuar sendo repugnante - o fato de políticos no poder buscarem popularidade em clubes de futebol. Ainda mais quando as avaliações de seus trabalhos (ou a falta deles) andam em baixa e o clube tem uma imensa torcida e vem de uma vitória importante. Portanto, o que o atual presidente fez há poucos dias ao visitar o treino do Flamengo, em Brasília, ilustra bem o caso acima. 

O mais aterrador é o clube, ou melhor, seus atuais dirigentes e jogadores, aceitarem de bom grado a (que pelo menos deveria ser) incômoda visita. Afinal, além do contínuo desrespeito a todas as regras para se evitar a transmissão do corona vírus (e ainda ser garoto-propaganda de remédios comprovadamente ineficazes e em alguns casos maléficos), o desmandatário deste país é um notório defensor da tortura e exalta como herói nacional um sádico torturador (seu vice concorda plenamente), tendo inclusive feito impunemente uma declaração pública neste sentido dentro do Congresso Nacional durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff.

Um clube como o Flamengo, que teve um atleta de remo morto sob tortura durante a ditadura militar de 1964 a 1985, da qual o capitão no poder é um entusiasta, jamais deveria aceitar sequer proximidade com um ser como este. Porém, não foi a primeira vez. Toda vez que o Flamengo vai a Brasília, ele se encosta e os dirigentes rubro-negros se empinam alegremente, com toda subserviência. Stuart Angel, filho de Zuzu Angel, outra que foi assassinada pelos militares que estavam no poder na década de 70, foi remador do clube e chegou a conquistar um bicampeonato carioca. Mas para o Flamengo de hoje isso não tem a menor relevância. 

Abro um parêntesis aqui para deixar claro que não concordo, a e em princípio, com nenhuma luta armada, e defendo que crimes devam ser punidos de acordo com suas proporções previstas em lei, mas jamais, em tempo algum, com tortura (com ou sem assassinatos). Muito menos com as que Stuart sofreu e que não vou relatar aqui por serem deprimentes demais. Quem quiser saber é só pesquisar. Isto é uma questão de dignidade humana, de valor pessoal, vem muito, muito antes de política. 

Por essas e muitas outras (as atitudes em relação às mortes dos Garotos do Ninho em destaque), eu já vinha me afastando do Flamengo e do futebol, mais ainda quando o clube se tornou aquele que mais forçou o retorno aos jogos durante a pandemia. Continuei torcendo pelo clube, mais por hábito do que com o coração, e acompanhei tudo de longe, sem ouvir ou ver um jogo sequer desde março do ano passado. Agora, com mais esta aproximação indecente com o atual presidente, que por sua inépcia ou maldade mesmo, tem gigantesca responsabilidade pelas (atuais) quase 220 mil mortes pela Covid-19, fico ainda mais longe disso tudo. Continuarei acompanhando o noticiário, mas meu coração ficará bem distante.

Momento Jogada de Música

Esta relação do podre poder com o Flamengo não é de hoje, claro. Um dos ídolos do atual presidente, Emilio Garrastazu Médici, se dizia torcedor do clube da Gávea, e isso foi motivo para os irmãos botafoguenses Marcos e Paulo Sérgio Valle criarem uma música, chamada "Flamengo até morrer", ironizando este fato de tal forma que muitos encararam na época (1973) como uma homenagem ao Rubro-Negro. Porém, evidentemente, era uma forma de driblar a censura e emplacar uma crítica à fuga que o futebol representava (e ainda representa) para o povo dos seus imensos problemas cotidianos e também um protesto contra os crimes que os donos do poder cometiam por baixo dos panos, sem que nada pudesse ser noticiado.  Ouça abaixo.

 

Esta citação artística acima prova mais uma vez que o projeto Jogada de Música não está morto, apenas está em pausa para recuperar suas forças e no momento adequado voltar a buscar financiamento para viabilizar o documentário, a série para TV, os shows, a exposição multimídia, os debates musicados,  programa de rádio, podcast, entre outras possibilidades imaginadas (e até iniciadas), mas ainda não estruturadas. Vida longa ao Jogada de Música!

E para mostrar que o futebol ainda continua correndo em minhas veias, apesar dos muitos pesares, em fevereiro será lançado na versão em papel e digital de "Contos da Bola", pela Cartola Editora. É só aguardar que em breve o livro estará na área e eu vou contar pra todo mundo ouvir. Conto com a sua torcida e leitura. Até breve!

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Música e futebol, o Brasil no Primeiro Mundo
O teatro e o futebol
O extremo perigo de se alimentar monstros
A todos os torturados e assassinados durante a ditadura de 64
Cheiro de chumbo no ar
Flademia  

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: AMANHÃ

O mais previsível ao pôr aqui uma música de Guilherme Arantes seria selecionar "Meu mundo e nada mais" ou "Planeta Água". Porém, como gosto de fugir de padrões, obviedades, fáceis caminhos, aqui está "Amanhã", por vários motivos. O principal é porque foi dela que me lembrei no último fim de semana quando meu pensamento caiu numa desesperança total com tudo o que este país vem passando, especialmente desde 2018, com nossas instituições e nosso povo anestesiados, assistindo passivamente ao circo dos horrores atear o fogo dos infernos para se chegar a um céu cinzento. Cinzento de cinzas!

As outras duas músicas merecem e estarão em algum momento por aqui, como também "Coisas do Brasil" e outras deste grande artista brasileiro. Assim como "Meu mundo e nada mais", que me apresentou a Guilherme Arantes nos idos de 1976 (na novela Anjo Mau!), quando contava eu os dez dedos das mãos para revelar minha idade, "Amanhã" é daquele tempo, mais precisamente um ano após. E como parece que, apesar de tudo, ainda acreditamos fielmente que somos um país do futuro, continuamos a crer no amanhã. E que se inicie hoje. Ontem!

A esperança de dias melhores sempre há de estar por aqui. E mesmo com este ou aquele, estes, aqueles, estas e aquelas, "apesar de hoje, será a estrada que surge pra se trilhar". Amanhã há mesmo de ser outro dia, "mesmo que uns não queiram".

Enquanto o gado muge amuado ou irado lá fora, vamos ficar com o grande Guilherme Arantes, em interpretação maravilhosa no vídeo abaixo, gravado no Coaxo do Sapo, seu estúdio que fica no Litoral Norte da Bahia.


domingo, 17 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: SENTIMENTO DE POSSE

Ah, que saudade das rodas de samba, que saudade! Na noite do mais recente Ano Novo e nos fins de semana seguintes, o samba tem predominado no repertório aqui de casa, especialmente uma série de discos chamado "Samba de Raiz ao vivo". E "Sentimento de posse", de Adilson Bispo e Zé Roberto, gravada originalmente pelo grupo Pirraça, em 1989, e pouco tempo depois pelo Raça, me remeteu às rodas de samba que acabamos não frequentando ainda aqui em Florianópolis, apesar de termos planejado conhecer várias delas.

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Mas a pandemia invadiu este pandemônio chamado Brasil e nos deixou sem lazer e eventos culturais fora de casa, desde o dia 15 de março do ano passado. Ao menos conseguimos ir a um ótimo show do mestre Paulinho da Viola, na UFSC, em novembro de 2019, o que, creio eu, nos redime com certa folga desta nossa falta.

Então, embora seja da mesma filosofia de vida do supracitado mestre, "Meu tempo é hoje", não pude evitar certa nostalgia das incríveis noites e madrugadas no Sobrenatural do Samba e no Mercado das Pulgas, em Santa Teresa; no Trapiche Gamboa, no Centro do Rio; no Candongueiro, nos tempos em que era em Maria Paula (Niterói), e em tantos outros lugares onde o pagode de mesa comia solto e só se via todo mundo sorrindo, cantando, dançando.  

O samba de Adilson Bispo e Zé Roberto me leva de volta àqueles ótimos momentos, que em breve voltarão, porque "apesar de você amanhã há de ser outro dia". Então, curta abaixo o grupo Revelação com uma galera boa no gogó, no batuque e nas cordas: "É difícil dizer, qual de nós tem razão..."


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quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: FOLHAS SECAS

"Quando piso em folhas secas, caídas de uma mangueira, penso na minha escola e nos poetas da minha Estação Primeira...". Sem dúvida alguma estes são dos versos e das melodias mais lindas que o samba carioca já produziu, criadas pela mente e o coração de Nelson Cavaquinho e de Guilherme de Brito. Foi gravada por inúmeros cantores e cantoras, duas em especial: Beth Carvalho e Elis Regina. Como Elis já pintou por aqui na vez passada, agora chegou o momento da Madrinha do Samba, a quem tive a honra e o privilégio de entrevistar no salão nobre do Botafogo, seu clube do coração, na eleição que levou Bebeto de Freitas à presidência do Alvinegro, no fim de 2002.

As gravações de Beth e Elis são muito diferentes e adoro as duas versões. A da Pimentinha é mais intimista, num ritmo mais cadenciado, em clima bem bossanovista, enquanto que com a Madrinha é o sambão comendo solto.

Na busca pelo vídeo que apresentasse "Folhas Secas" com Beth Carvalho, achei um que já conhecia, de seu DVD "A Madrinha do Samba ao vivo convida", de 2004, em que o violinista francês radicado no Rio de Janeiro Nicolas Krassik faz participação especial, e outro do programa "Samba na Gamboa", com os auxílios luxuosos de Diogo Nogueira, o apresentador da atração da TV Brasil, e do "Jimmy Hendrix do Bandolim", Hamilton de Holanda (um dia conto sobre a primeira, única e espantosa vez que o vi tocar, na Cobal do Humaitá, quando era praticamente desconhecido no Rio, vindo de Brasília). "Samba na Gamboa", aliás, gravado no Trapiche Gamboa, local em que estive inúmeras vezes na década passada para curtir um ótimo samba comandado pelo cavaquinista Eduardo Gallotti, um velho conhecido dos tempos de Sobrenatural do Samba, em Santa Teresa.


Falar de Beth é também falar de Mangueira, escola com a qual primeiro me simpatizei, ainda criança, pela relação que muitos fazem (ou faziam com o Flamengo). Percebi mais tarde que estas relações de escola de samba com clubes de futebol nunca fizeram sentido no Rio de Janeiro, esta é a realidade, que em São Paulo é bem diferente. Beth era botafoguense apaixonada; Chico Buarque é tricolor apaixonado, e Sérgio Cabral pai é vascaíno e todos são mangueirenses.

Apesar dessa minha simpatia que depois fixei na União da Ilha, por causa de seus belíssimos sambas e desfiles do fim dos anos 70 e início dos 80, como já escrevi quando apresentei "É hoje!" nesta série, nunca fui à quadra da Mangueira, nem a ensaios da Verde e Rosa. Porém, convidado pelo saudoso Andre Filho, radialista, ator e o melhor dublador de TV ao menos em sua época (fez as vozes do Homem de Seis Milhões de Dólares, dos personagens de Sylvester Stallone, incluindo Rambo e Rocky Balboa; do personagem Jonathan Hart, do Casal 20, entre muitos outros), pude jogar uma ótima pelada no campo de terra batida que havia lá no fim dos anos 80 e depois tomar uma cervejinha num boteco. 

Mas vamos curtir a beleza de "Folhas Secas", com a inesquecível Beth Carvalho. Pode escolher a sua versão favorita aí abaixo entre as duas opções. 



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quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

OS 20 ANOS DO MELHOR ROCK IN RIO DE TODOS OS TEMPOS

Visão aérea da Cidade do Rock, em 2001
O início daquele que considero o melhor Rock in Rio de todos os tempos completou ontem 20 anos. Em 12 de janeiro de 2001, a Cidade do Rock original voltava a receber uma edição (a terceira) do festival, 26 anos após a histórica versão de estreia. Embora o de 1985 seja emblemático por todos os motivos do mundo, o melhor de todos para mim foi o de 2001. E por diversas razões, além das puramente musicais (nem tão puras assim, aliás). A idéia de se fazer um palco chamado Brasil, com feras brasileiras de primeira linha, muitas imensamente maiores que alguns dos artistas que estiveram no palco principal, e outro Raízes, foi muito boa.

Pena que o terreno não permitia que houvesse shows simultâneos com o chamado Palco Mundo. O grupo mineiro Uakti, por exemplo, teve de parar a sua esplêndida apresentação, porque um grupo no chamado Palco Mundo começara a tocar e o som mais potente inviabilizava a continuação, apesar dos apelos do público embevecido. Foi a única das 3 edições que pude estar presente todos os dias, pois trabalhava no 2º Caderno do jornal O Fluminense, de Niterói (RJ), e fui designado a escrever um resumão após cada fim de semana, além de enviar algum texto ou informações pontuais durante shows específicos. 

A quantidade de espetaculares, ótimos e bons shows é muito grande. Tive a oportunidade de conhecer alguns grupos e artistas estrangeiros que desconhecia completamente e me fizeram buscar CDs e posteriormente vídeos no YouTube deles ou sobre eles. Foi a primeira (e infelizmente acabou sendo a única) vez que vi o grupo Anima em ação. Na verdade, eles que abriram o festival no palco Raízes, e aproveitei que a galera ainda não tinha chegado em massa para abordá-los após o show e pegar contatos para uma entrevista para o então site Papo Carioca, que fiz pouco tempo depois e reproduzi aqui neste blog.

Neil Young em ação.  Foto: Ivan Gonzalez/Ag. Oglobo
Há tantas histórias incríveis - uma inacreditável - para contar daqueles sete dias (três no primeiro fim de semana e quatro no segundo) que deixarei para outra ocasião, senão isso aqui vira um livro. No Palco Mundo, os showzaços, aços, aços a que assisti foram os seguintes, por ordem cronológica: Barão Vermelho e REM, no dia 13 (sábado); Elba Ramalho e Zé Ramalho, e Neil Young, no dia 20 (sábado). Neil Young é um capítulo à parte, pois com seu grupo Crazy Horse invadiu a madrugada do dia 21 com uma sonzeira inesquecível. Saí de lá querendo ainda mais e, sem dúvida, foi um dos melhores shows que vi na vida.

O Iron Maiden, que se apresentou no dia 19 (sexta), entraria facilmente nesta lista, mas infelizmente tive de deixar a Cidade do Rock pouco antes do show do grupo inglês começar, por causa de uma alucinante dor de ouvido. Acabei assistindo todo o espetáculo pela TV na casa do amigo em que estava hospedado lá pertinho. Eles gravaram um DVD desta apresentação que fez muito sucesso.

Iron Maiden no Rock in Rio 2001: Bruce Dickinson entre os guitarristas Dave Murray e
Adrian Smith. O baixista Steve Harris está ao fundo, de costas. Foto: divulgação

Os ótimos shows foram os de Gilberto Gil, que antes se apresentou com um ainda debilitado Milton Nascimento, que esteve doente na época e foi ajudado também por Lô Borges e a Orquestra Sinfônica Brasileira, e Sting, no dia 12; Cássia Eller, que também tem um DVD daquele dia, no dia 13, e Dave Matthews Band, no dia 20. Kid Abelha e Sheryl Crow, no dia 20, e Capital Inicial, no 21, fizeram bons shows.

Cássia Eller. Foto: Divulgação
Os Palcos Brasil e Raízes muitas vezes tinham shows ocorrendo no mesmo momento, fosse antes da abertura do Palco Mundo ou durante os intervalos, por isso não dava para ver tudo. Porém, revendo a lista dos shows do Palco Brasil, eu me recordo muito bem da apresentação estupenda de Pepeu Gomes e Armandinho, no dia 19, com a galera do heavy metal delirando. No entanto, vejo que perdi ou vi sem me recordar os grandes Luiz Melodia, Sá, Rodrix e Guarabyra e Márcio Montarroyos, que vi extasiado pela primeira vez no Parque da Catacumba nos anos 80.

No Palco Raízes, os melhores foram o já citado Anima, embora prejudicado pelo som muito baixo; Thierry Robin (violonista cigano da Bretanha, França), o iraniano Trio Chemirani (pai e seus dois filhos percussionistas), o grupo irlandês Dervish e o também já mencionado Uakti. Logicamente houve outros excelentes, especialmente os africanos, como acredito que tenha sido o de Carlos Malta e Pife Muderno, mas citei os que me recordo vivamente ainda. 

Fique abaixo com o show completo do Neil Young, até para você achar que exagerei, embora sem o clima do local e da hora que vivi junto a outras milhares de privilegiadas pessoas. Público selecionado, como disse naquele mesmo dia para mim um colega jornalista.
 

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segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: COMO NOSSOS PAIS

Impossível ouvir esta música com a interpretação magnífica e apaixonada de Elis Regina e não me arrepiar, sentir os olhos inundando pouco a pouco vencendo facilmente aquele velho machismo que se debate, estrebucha e berra de desespero por dentro: "homem não chora!". Ainda não havia escolhido a próxima música para esta série, e até meio esquecido de pensar nisso, quando após assistir a umas entrevistas no YouTube me foi oferecido um vídeo de um professor de voz americano (acho que americano) reagindo a este vídeo aí abaixo. Vi, comovi-me, claro, ainda mais com as reações entusiasmadas dele, e só depois me dei conta que já tinha a 27ª música que nos faz viajar.

Elogiar Elis é chover no molhado. Sim, um clichê para destacar outro. Porém, mais difícil é encontrar palavras que definam o quanto sua voz e emoção ao cantar provoca em quem realmente se conecta com a Arte. Ainda mais quando ela canta "Como nossos pais", uma das muitas inspiradíssimas obras de Belchior, artista que estará aqui muitas vezes, podem cobrar. Com sua alma, Elis recriou a música, que já era - e é - ótima com o seu compositor. É, comparando ao mundo da bola, quando um craque dá um passe espetacular para um gênio, simples assim.

Os versos extraordinários de Belchior ganham uma força estupenda na voz, nos gestos, nos olhares de Elis, é só observar com um pouquinho de atenção a essa apresentação no Fantástico, de 1976. Felizes - e certamente sabiam disso - todos os que tiveram a oportunidade de assistir Elis ao vivo, especialmente naquele espetáculo "Falso Brilhante", com Cesar Camargo Mariano. Infelizmente não tive esta chance, mas não lamento. Eu a ouço repetidas vezes e é como se fosse aqui e agora. Como esta poesia de Belchior, tão atual, tão gritantemente atual, 45 anos depois. 

"Mas é você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem!"...  "Minha dor é perceber que apesar de tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais!".


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quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

DO EXTREMO PERIGO DE SE ALIMENTAR MONSTROS

Foto de Saul LOEB (AF)
Os lamentáveis e trágicos acontecimentos desse já histórico 6 de janeiro de 2021 nos Estados Unidos revelaram mais uma vez o quão pavoroso e extremamente perigoso é confiar em extremistas, delirantes, ignorantes e egocêntricos no poder. Escrevo olhando para o Norte, mas logicamente sem desviar um segundo sequer os olhos de nossa terra. Afinal, temos um macaco de imitação de qualidade ainda mais baixa na Presidência da República. A diferença é que nossas instituições têm demonstrado muita frouxidão, demasiada frouxidão, e o barco está à deriva há tempos. Por muito pouco não tivemos uma invasão ao STF no primeiro semestre do ano passado, é bom ressaltar e ficarmos num só exemplo.

Foto publicada na
BBC News Brasil sem crédito
Não é novidade alguma a mistura do misticismo pseudo-religioso, moralismo hipócrita, com delírios manipuladores baseados nas mais estapafúrdias teorias de conspiração, a invenção de inimigos e consequente perseguição a eles, a disseminação de notícias falsas, um vitimismo travestido de heroísmo, o uso da política e do patriotismo (o último refúgio dos canalhas, como bem disse Samuel Johnson no século XVIII) para fazer de apoiadores fantoches. Porém, estes erros se repetem pela total falta de conhecimento, por desinteresse, preguiça de ler, ouvir, ver, estudar, analisar ou por interesses escusos, falta de caráter mesmo. Esta mesma ignorância, esta mesma preguiça, esta mesma avidez por grana e poder levou um preguiçoso, ignorante e ganancioso ao poder, aqui e lá. E em outros lugares também, tanto à direita, como são os casos citados, quanto à esquerda, é bom que se frise.

Foto de Myke Sena para o site Metrópoles
Não tenho ilusões de que a irresponsabilidade, a inconsequência assassina, do ainda presidente dos Estados Unidos vá despertar para o absurdo em que se encontram corações e mentes dos fiéis cegos seguidores de seu fanático fã brasileiro, que se já fez acusações sem provas de fraude nas eleições que venceu, imagine o que fará quando perder. E manifestou mais uma vez apoio ao seu ídolo, enquanto autoridades do mundo inteiro repudiavam a atitude criminosa dele. No entanto, espero que finalmente nossas instituições saiam da sua sonolência, parem de empurrar com suas protuberantes barrigas a imundície para debaixo dos tapetes e ajam, antes que seja tarde demais.

Na verdade, tarde já é, muito, entretanto ainda há tempo de se tomar as medidas necessárias para se impedir que a inépcia genocida do principal desgovernante deste país deixe morrer mais 200 mil pessoas por causa de um vírus ou ele mesmo contagie de vez sua horda rumo a uma guerra civil, que sempre foi o seu desejo (é só rememorar muitas das suas declarações ao longo de sua desprezível vida na política). Se não agirem logo, não com violência, mas no limite das leis que estão na nossa Constituição, certamente veremos uma tragédia muito maior, não em vídeos e fotos, mas entrando pelas nossas janelas.


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Quando a pátria fica acima de tudo, esmaga também seus adeptos 
Quem Jesus matou?
O sorriso do carrasco
Cheiro de chumbo no ar
Anti-Luther King: a E.E.ra das Trevas

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: COMPORTAMENTO GERAL

Comportamento Geral vem aqui para protestar contra o culto à ignorância celebrado há décadas no país e a frouxidão de seu povo e suas instituições, que ouvem o zurrar diário do palácio como se fosse a bela voz de um rei. A culpa disso tudo, claro, é de quem escuta zurros em vez de canto, afinal jogar a responsabilidade para os outros é a "arminha" que os incompetentes, ignorantes, indolentes, pilantras exibem para tentar disfarçar sua incompetência, ignorância, indolência, pilantragem. 

Mas Gonzaguinha é muito maior que estas miudezas e mediocridades. E compôs e gravou outras lindas músicas e letras, que certamente estarão aqui em outras oportunidades, seja com ele cantando ou outro(a) grande artista. O que impressiona especialmente em Comportamento Geral é que ela foi lançada originalmente num compacto simples, em 1972, e parece que (tirando a citação ao fuscão) vai ficando cada vez mais atual. 

Infelizmente, Gonzaguinha faleceu muito novo (com 45 anos de idade), num acidente de carro, em uma estrada do Paraná, em 1991, após uma apresentação na cidade de Pato Branco, onde acho que pus um pé (ou quase) em janeiro do ano passado, quando fui a São Lourenço do Oeste (SC), município vizinho.

Na única oportunidade que tive de vê-lo ao vivo, acredito que uns dez anos antes da sua despedida dos palcos da vida, foi no ginásio Hugo Padula, do Grajaú Country Club. No entanto, ele se sentiu mal nas primeiras músicas e deixou o palco sem nem chegar perto da metade do show. Lembro-me sempre disso quando ouço suas músicas e agradeço por elas se eternizarem em mim e em tanta, tanta gente.

Comportamento Geral

Você deve notar que não tem mais tutu
E dizer que não está preocupado
Você deve lutar pela xepa da feira
E dizer que está recompensado

Você deve estampar sempre um ar de alegria
E dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão
E esquecer que está desempregado

Você merece
Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba e amanhã, seu Zé
Se acabarem teu carnaval

Você merece
Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba e amanhã, seu Zé
Se acabarem teu carnaval

Você deve aprender a baixar a cabeça
E dizer sempre: muito obrigado
São palavras que ainda te deixam dizer
Por ser homem bem disciplinado

Deve pois só fazer pelo bem da nação
Tudo aquilo que for ordenado
Pra ganhar um fuscão no juízo final
E diploma de bem-comportado

Você merece
Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba e amanhã seu Zé
Se acabarem teu carnaval

Mas você merece
Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba e amanhã seu Zé
Se acabarem com teu carnaval

Você, você merece
Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
E um fuscão no juízo final

Você merece
E diploma de bem-comportado
Você merece
Você merece
Se esqueça que está desempregado
Você merece
Você...
Tudo vai bem, tudo legal
Que maravilha


terça-feira, 5 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: FOOL'S OVERTURE

Falar de Supertramp é retornar à minha adolescência. Foi certamente o grupo daquele período da minha vida. Ouvi "Paris" (1980) e os outros LPs que comprei a seguir tantas vezes que não dá nem para ter idéia de quantas foram. O duplo ao vivo na capital francesa, então, nem se fala. Mas "Even in the quietest moments" (1977), talvez o mais melancólico do grupo inglês, seja o que mais gosto de todos os de estúdio, incluindo "Crime of the Century" (1974), que tem 7 de suas 8 músicas no "Paris". E é no disco de 1977, cuja a música título é belíssima também, que está a épica "Fool's Overture".

A viagem sonora da parte instrumental e dos vocais de Roger Hodgson, seu verdadeiro compositor, e Rick Davies, seu coautor oficial, me conquistou de primeira, quando ouvi o duplo ao vivo na casa de um amigo. Já contei esta história em outra postagem e o link vai lá embaixo.

Veja também:

Mas o que importa é o "Prelúdio do Louco" que pretendo tratar aqui. Longa para os padrões radiofônicos, ela pouco apareceu em emissoras de rádio e TV, como "Dreamer", Give little bit", "The Logical Song", "Take the long way home", "It's rainning again" etc. No entanto, qualquer fã do Supertramp, e mesmo aqueles que nem são tão fãs, mas apreciam uma ótima música, com uma letra bem feita e curiosa, que fica entre o filosófico e o irônico, não pode ignorá-la. Muito pelo contrário, especialmente pela interpretação de Hodgson, com sua voz marcante.

Sem mais muito papo, então, aí vão duas versões de "Fool's overture": a original, em estúdio, e ao vivo, em Paris, com a letra no segundo vídeo.


sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

MÚSICA PRA VIAGEM: ESTRELA SOLITÁRIA

A maior prova de que o projeto Jogada de Música não abandonará a batalha e prossegue na disputa por seu lugar no campo da Cultura brasileira é esta belíssima música: "Estrela Solitária", de Zécarlos Ribeiro, gravada pelo grupo Rumo em 2018. Por quê, você pode estar se perguntando. Porque a descobri tem poucos dias durante a ótima programação da Rádio Devaneio, do meu amigo Luiz Antônio Mello, e não me furtei a colocá-la no extenso material de pesquisa de Jogada de Música.

O Rumo é um histórico grupo da Vanguarda Paulista, movimento que reuniu na Lira Paulistana nomes como Itamar Assumpção, Arrigo Barnabé, Premeditando o Breque (posteriormente Premê), entre outros, a partir do fim dos anos 70. Formado pelos irmãos Paulo e Luiz Tatit reúne outras tantas feras em seu timaço, entre elas a cantora Ná Ozetti, que tem ao menos uma outra música intimamente relacionada ao futebol em seu currículo, como por exemplo, a que Zé Miguel Wisnick fez em homenagem ao Doutor Sócrates.

Porém, o papo aqui é "Estrela Solitária", uma inspiradíssima obra que viaja do tempo-espaço, da imensidão do céu e do mar à leveza dos dribles de Mané Garrincha, ludibriando a Lei da gravidade, "iluminando o Maracanã". "A bola é a Terra/ A bola é o Sol/ A bola é a Lua/ A bola é gol". 

Deleitem-se, isto aqui é Música!  

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Na dança de "Dinam-Nietzsche"
Cia Dos à Deux, a poesia do corpo
Entressafra
Pesadelos
"O rio" entrelaçado à "Sequidão"