A prisão de fanqueiros no Rio de Janeiro fez levantar a turma dos bailes em defesa da liberdade de expressão. A situação educacional, cultural e ética deste país anda tão rasteira que muitos acham que ter liberdade para dizer o que se pensa (pensa!?) é se eximir de qualquer responsabilidade sobre o que publicamente se diz – ou canta (canta!?) – e consequentemente ficar livre de qualquer penalidade.
Antes de tudo, o fânqui é um produto cultural de uma cidade que optou ao longo dos últimos 30, 40 anos por se descaracterizar, se aculturar, pela superpopulação, pelo crescimento urbano desorganizado, pela baderna, pelo jeitinho, o passa-perna, a esperteza, a valorização do grotesco, do imundo, do desrespeito e da bandidagem, que não se limita aos morros é muito bom que se ressalte.
Não sou advogado, muito menos juiz, para saber se a punição com prisão destes fanqueiros especificamente foi exagerada ou não. O que sei há muito, muito tempo é que o fânqui chamado de “proibidão” sempre foi o braço cultural do tráfico de drogas e armas e obviamente por ele foi financiado. Então, quem se associou com o tráfico tem sim de ser preso. O maior problema é que os verdadeiros financiadores deste lucrativo comércio ilegal, os barões do tráfico de drogas e armas, continuarão livres para mandar e desmandar por essas bandas. Um parêntese: em tese sou a favor da liberação das drogas (das armas, jamais), mas não vou entrar neste mérito agora para não misturar as estações.
Infelizmente este esgoto cultural, esta anomalia carioca chamada fânqui (e aqui me refiro não só ao “proibidão”) desceu as vielas dos morros cariocas, onde antes se produzia o melhor do samba, para ganhar não só mansões e casas de festa do Rio de Janeiro e do Brasil, mas boates de várias partes do mundo, com suas letras chulas e musicalmente da pior espécie.
Um dos fanqueiros defensores da “liberdade de expressão” chegou a insinuar que se fosse criado nos morros no mundo de hoje, Cartola comporia e cantaria fânqui. Prefiro acreditar que o velho Angenor optaria por continuar lavando carros pra tirar um trocado, até o fim da vida.
Vídeo: "O Mundo é um Moinho" (Cartola)
Veja também:
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Os Sopros Mágicos de Carlos Malta
Edu, excelente texto. Mostra a evolução (ou será involução?) do processo cultural da nossa Cidade Maravilhosa numa abordagem clara e direta.
ResponderExcluirLogo antes de ler seu texto escutei Villa-Lobos (Bachianas Brasileiras 5) no post da Lu Tecidio no FB e, enquanto escutava, me perguntava: "Como pode alguém chamar fânqui (gostei dessa grafia) de música?"
Quanto ao velho Angenor, prefiro parafraseá-lo: "A sorrir eu pretendo levar a vida. Pois chorando eu vi a mocidade perdida." (A Sorrir - Cartola)
Ops, não me identifiquei no comentário anterior...
ResponderExcluirUm abraço,
Zé Heraclito
É o caos caro Edu, enfileirado em antros, anestesiados agachadinhos, loucos, lisos, fingindo e cantando
ResponderExcluir"...Eu só quero é ser feliz,
Andar tranquilamente na favela onde eu nasci, é.
E poder me orgulhar,
E ter a consciência que o pobre tem seu lugar. Mas eu só quero é ser feliz, feliz, feliz, feliz, feliz, onde eu nasci.
E poder me orgulhar e ter a consciência que o pobre tem seu lugar..."
Confundem miséria humana com pobreza, autoridade com desrespeito e hierarquia com poder.
Lamentável.
A mim resta agora, a sorte de ter olhos que querem ver e ouvidos que querem escutar e vou seguindo com Cartola a cantarolar(O Pranto do Poeta)
ai ai
"Em Mangueira
Quando morre
Um poeta
Todos choram
Vivo tranqüilo em Mangueira porque
Sei que alguém há de chorar quando eu morrer
Mas o pranto em Mangueira
É tão diferente
É um pranto sem lenço
Que alegra agente
Hei de ter um alguém pra chorar por mim
Através de um pandeiro ou de um tamborim"
lá lá lá aia aia...
Adorei este tal de funqui rsrs. Agora citar Cartola ta de sacanagem!rsr se fosse assim nosso ilustre compositor, nos anos 60 estaria dançando o Twist!!!
ResponderExcluirFernando Cid
Muito obrigado pelos comentários, minha gente! E viva Cartola!
ResponderExcluirForte abraço.