Ao fim da homenagem de José Messias a Garrincha, houve rápida
dispersão. Zé Ary, como ótimo mestre de cerimônias que vinha se revelando, fez
a bola girar com um novo tema lançado para os nossos amigos.
Garçom: - O futebol tem cada expressão, né? Tem
umas que acho muito curiosas e não sei de onde vieram. Zebra, por exemplo...
João Sem Medo: - Zé Ary, a expressão foi criada
pelo técnico Gentil Cardoso na década de 60. Gentil, que é também o autor da
frase “quem desloca recebe e quem pede tem preferência”, era técnico da
Portuguesa da Ilha do Governador e antes de um jogo em 64 contra o Vasco disse
que se seu time vencesse seria como dar a zebra no jogo do bicho.
Garçom: - Não tem zebra no jogo do bicho!
João Sem Medo: - Pois, então. A Portuguesa venceu
por 2 a 1 e o termo ficou pra sempre.
Zebrinha do "Fantástico", criação de Borjalo |
João Sem Medo: - Neném Prancha foi meu treinador na
praia. Meu, do Heleno de Freitas, do Sandro Moreyra... Lembra disso, né? (fala
em direção a Neném Prancha, que concorda com um gesto) Ele era, ou melhor,
é um grande frasista. Diz as mais famosas, aí, Neném!
Neném Prancha se levanta pra se dirigir a João e ao público.
Neném Prancha: - Obrigado, João. Bom, algumas das que criei foram “Jogador de futebol
tem que ir na bola com a mesma disposição com que vai num prato de comida”;
“Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende”; “Se
concentração ganhasse jogo, o time do presídio não perdia uma partida”; “Se
macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminava empatado”, “Futebol é uma
caixinha de surpresa” e outras.
João, os amigos, o público, todo mundo aplaude no bar Além da
Imaginação.
Garçom: - Esta última tem tudo a ver com a
da zebra.
Sobrenatural de
Almeida: - Caixinha de
surpresa, zebra, isso tudo no futebol só existe por causa do papai aqui. Em 26,
o São Cristóvão derrubou o favoritismo de Vasco, Flamengo e Fluminense e foi o
campeão carioca.
Veja também:
Terminada a música nas caixas de som do bar, Ceguinho retoma
a pelota.
Ceguinho Torcedor: - O São Cristóvão foi campeão em 26 porque foi um clube à
frente do seu tempo. Mario Filho, o Criador das Multidões, relatou isso no seu
livro eterno: “O negro no futebol brasileiro”. Já naquela época o São Cri-Cri
tinha um ônibus e seus atletas treinavam correndo nas areias da praia de
Copacabana de chuteira e meiões. Os atletas do São Cristóvão chegando
uniformizados à praia pareciam os aliados desembarcando na Normandia no Dia D!
João Sem Medo: - Um dia inesquecível, meus amigos! Tive a honra de desembarcar
na Normandia ao lado do Marechal Montgomery.
Alguns na plateia não conseguem segurar o riso, mas João não
percebeu ou fingiu que não ouviu. Sobrenatural de Almeida aproveitou a deixa no
vácuo e retomou o assunto.
Sobrenatural de Almeida: - Olha, senhoras e senhores, além de uma forcinha
minha, o segredo mesmo do São Cristóvão era o mingau da Negra Balbina e as
gemadas com ovos da granja de Álvaro Novais. Coisa de outro mundo! Hahahaha
Ceguinho Torcedor: - Aquele era um time com saúde de vaca premiada!
Veja também:
Idiota da Objetividade: - O São Cristóvão foi campeão carioca de 1926 com
uma campanha de catorze vitórias, dois empates e duas derrotas. O título veio
após uma goleada de 5 a 1 sobre o Flamengo, que seria o quinto colocado, no
antigo estádio da Rua Paissandu. A equipe que entrou em campo para a última
partida formou com Paulino; Póvoa e Zé Luiz; Julinho, Henrique e Alberto;
Osvaldo, Jaburu, Vicente, que foi o artilheiro do campeonato, com 25 gols,
Baianinho e Teófilo. Participaram da campanha também Doca, Mendonça, Martins e
Luis Vinhaes, que depois se tornou o técnico do time. Foram ao todo 70 gols
marcados e 37 sofridos.
João Sem Medo: - É bom lembrarmos que, sete décadas depois, o São Cristóvão
revelou o Ronaldo, que passou a ser chamado de Fenômeno na Itália.
Garçom: - Verdade, seu João! Vamos aproveitar então para fazer uma
homenagem ao São Cristóvão?
Todos concordam.
Garçom: - Quase todo o time campeão de 26 está aqui. Peço que se
levantem e sejam aplaudidos, por favor.
São muito aplaudidos, especialmente o artilheiro Vicente,
quando apresentado.
Garçom: - Bom, vamos chamar ao palco um dos grandes cantores da
história da nossa música para cantar a Marcha ou hino popular do São Cristóvão,
composta por Lamartine Babo, que já se apresentou aqui e também merece aplausos.
Com as senhoras e os senhores: Silvio Caldas.
Lamartine, primeiro, Silvio Caldas, depois, agradecem os
aplausos.
Fim do Capítulo #25
Episódio originalmente publicado em 20 de julho de 2022 e republicado totalmente modificado em 4 de fevereiro de 2025.
Esta série é uma homenagem especial a João Saldanha e Nelson Rodrigues e também a Mario Filho e muitos dos artistas da música, da literatura, do futebol e de outras áreas da Cultura do nosso tão maltratado país.
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